Computador na escola: a solução dos problemas da
educação brasileira?
Computador na escola! - até bem
pouco tempo, um "privilégio" quase que exclusivo das escolas
particulares. Com o Programa Nacional de Informática na Educação, em
implementação pelo MEC e pelas Secretarias de Estado de Educação, esse
"privilégio" passa a ser também de muitas escolas públicas
brasileiras. Comunidades escolares de todos os lugares do Brasil movimentam-se
no sentido de conseguir um laboratório de computadores e colocar seus alunos em
contato com a tecnologia. Entretanto, a maioria dessas comunidades não tem
clareza dos motivos que provocaram essa corrida em busca da tecnologia, nem dos
mitos, concepções e ideologias que perpassam a introdução do computador na
escola.
Para que a introdução dessa
tecnologia não se transforme em mais uma panacéia, como tantas outras
experiências vivenciadas na tentativa de resolver os problemas da educação
brasileira, torna-se necessário refletir, discutir e entender todas as
implicações da introdução dessa inovação no processo pedagógico. Um dos fatores
que se faz necessário discutir é o motivo que provocou a introdução do
computador na escola.
Com a implementação no Brasil,
como na maioria dos países do mundo, de um novo modelo econômico, ocorreu uma
mudança em todos os setores da sociedade –economia, política, relações de
trabalho, valores. Para o país poder adequar-se a esse novo modelo e concorrer
de igual para igual com os países desenvolvidos no mercado internacional é
fundamental empregar os avanços científicos e tecnológicos no processo de
desenvolvimento econômico. Para tanto, é necessário preparar a população para
fazer uso da tecnologia de ponta, ao mesmo tempo em que a mesma é disseminada
pelo país. As políticas públicas passam a direcionar-se para a modernização de
todos os setores da sociedade, investindo-se maciçamente em tecnologia,
buscando atingir estágios superiores de desenvolvimento das forças produtivas e
da organização política e social.
Estrategicamente, o computador e
a Internet começam a aparecer na mídia, passando a ser um fenômeno popular; todos
querem ter acesso a essa tecnologia – inclusive as comunidades escolares -,
embora muito poucos consigam. A falta de condições econômicas e a resistência à
tecnologia, apresentada pela maioria da população economicamente ativa,
dificulta essa inserção.
Torna-se necessário então
investir na parcela da população que não apresenta essa resistência – os
jovens. Mas como atingir a juventude, se a maioria da população não apresenta
condições econômicas que possibilite o acesso à tecnologia? Obviamente, só tem
um caminho – a escola. Na escola, com um laboratório de 15 microcomputadores e
uma linha telefônica é possível atingir uma população de mais de 500 alunos.
Entretanto, da forma como tais
inovações estão entrando na escola, mesmo que sob a égide do discurso da
melhoria da qualidade da educação, torna-se difícil atingir os objetivos
esperados, pois não basta a presença das máquinas para que todos os problemas,
quer econômicos, sociais ou educacionais do país sejam resolvidos - o progresso
técnico, por sua natureza instrumental, não implica necessariamente em
modernização mais ampla da sociedade, em seus aspectos político, social e
cultural.
O computador tem chegado à
escola, na maioria dos casos, sem o respaldo de uma proposta pedagógica gerada
a partir de um estudo sistemático da comunidade escolar envolvida; a maioria
dos projetos envolvendo Educação e Informática desenvolvidos pelas escolas são
elaborados por grupos externos a elas, o que sujeita os poucos professores que
se envolvem nesses projetos ao papel de mero discípulos, receptores de
conhecimentos alheios e os torna alienados das reais necessidades e interesses
de sua comunidade; a tecnologia, via de regra, é incorporada ao modelo
tradicional de educação, servindo para auxiliar e reforçar a lógica desse
modelo - classificar, selecionar e excluir os "menos aptos"; as
direções das escolas usam a tecnologia como marketing, como forma de atrair
maior número de alunos; e os demais professores, os que deveriam ser os
principais responsáveis pelo uso desses recursos em sala de aula, não sabem
como lidar com eles nem como usá-los em suas aulas, o que mantém a grande
maioria dos professores das escolas à margem do processo; também não lhes são
fornecidas condições de tempo e estudo para inserir-se no processo.
A comunidade escolar ainda não
percebeu que a Informática na escola, sem o devido embasamento
teórico-metodológico, é uma forma de selecionar os mais aptos e marginalizar a
grande maioria, inclusive os professores. Isto porque somente aqueles que já
são dinâmicos e autônomos conseguem se adaptar à inovação sem uma proposta
pedagógica que lhe dê sustentação. Também não percebeu que, embora a introdução
das inovações tecnológicas na escola busque formar uma cultura informática,
onde todos tenham acesso às inovações, sejam impregnados pelos ideais de
modernidade e preparem-se para o mercado de trabalho, esse modelo econômico
comporta apenas uma pequena parcela da população, ou seja, persistindo o modelo
econômico atual, ter "domínio" - primeiras noções técnicas fornecidas
pela escola - das inovações não garante a inclusão no processo produtivo.
Por outro lado, a introdução das
Novas Tecnologias da Comunicação na escola pode significar uma possibilidade de
transformar o processo de cópia, transmissão e imposição de conhecimentos
prontos, próprios do modelo tradicional de educação, num processo dinâmico de
estruturação, potencialização e fortalecimento de novas idéias; idéias que
podem transformar a escola num espaço vivo de produção, recepção e socialização
de conhecimentos. O computador e as redes de computadores na escola oportunizam
que tanto alunos quanto professores percebam que a verdade e a universalidade
próprias do modelo tradicional não são mais questões fundamentais; com a
informática pode-se perceber que as informações veiculadas são sempre
transitórias, perecíveis e refletem o estado atual de uma determinada situação;
o conhecimento não é mais estático, encontra-se em metamorfose permanente.
Para que essa possibilidade se
efetive e possa-se atingir a tão falada "qualidade da educação" é
imprescindível que todos os membros da comunidade escolar, em especial os
professores, sejam envolvidos no processo e na discussão sobre os objetivos e
as possibilidades da introdução do computador e das redes de computadores na
escola, revisando e renovando conteúdos e procedimentos, de forma que uma nova
lógica possa instaurar-se na escola.
Essa reportagem foi escrita em
1998. 14 anos depois parece bem atual, não?
Maria Helena Silveira Bonilla
Jornal da Manhã, Ijuí - RS,
12 fev. 1998, caderno especial de Informática, p.2.
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